الأربعاء، كانون الأول ١٣، ٢٠٠٦

...... Resposta à contra-resposta

1- Não preciso esgueirar-me até à Ana Bola. O texto do “Homem a quem aconteceu não sei o quê” interpretado pelo Miguel Góis dos Gato Fedorento (com quem não tenho nenhuma querela pessoal mas acho que tem a graça de um Jaime Gama menstruado) seria uma peça morosa, quiçá irritante. Não nego a genialidade de RAP nem a genialidade que imprime intencionalmente aos seus textos, mas retomo que essa dificilmente está carimbada na prosa mas antes na predeterminação de como essa prosa será apresentada. Não é uma contenda da primogenitura do ovo ou da galinha: RAP é brilhante quando escreve porque escreve para brilhar na interpretação. E convém referir de novo, a celebrização do ideário popularucho, a descontextualização ou a hiper-contextualização da banalidade rotineira e a pantomina do quotidiano comuns e recorrentes em RAP estão aproximadíssimos de O’Brien. Enquanto no Late Night desfilam os nerds, os hillbillies, os irlandeses bêbedos, os hispânicos, os ítalo-americanos, os franceses, os alemães, piratas, duendes, ardinas dos anos 50, cozinheiros suecos, ou até o Donald Trump, todos pela boca do ruivo, no Tonight Show Leno limita-se a uma envergonhada imitação do governador da Califórnia e agrava a voz para retratar polícias a lerem relatórios à imprensa. Pode não querer dizer nada estatutariamente para esta destrinça, mas de certeza que impede que Ricardo Araújo Pereira seja posto na facção do grisalho queixudo.

2 – Concordo que se levantem dúvidas como as do maradona neste ponto. Eu estava consciente que, ao puxar a brasa à minha sardinha puxei também um bocadinho o elástico da semântica. É claro que Ricardo Araújo Pereira não está dentro do que é formal e consensualmente definido por humorista físico, mas nessa tal coisa da “caricatura das tipologias” mantenho que é o maior deste século em Portugal. Até o “Herman Enciclopédia” de Herman José (muito aclamado pelo próprio mas que nem assim me parece o seu maior momento) é do século passado e qualquer coisa de positiva que HJ tenha feito depois de 2001 não impede que seja destronado - muito por mérito de RAP mas sobretudo pela extensa lista de feitos hermanescos que o insultam a ele e à nossa memória dele.

3 – Desconheço onde está a graça do humorista em contradizer-se dessa maneira. Recordo vários episódios do Talk-Show (não sou doutorado e apenas assíduo de 2 ou 3 episódios nos compactos de fim de semana) em que ele refere os argumentistas do monólogo quando a coisa corre mal. Numa ocasião recente, com um público difícil, Leno fez referências contínuas à folga dos argumentistas judeus como explicação para o falhanço do monólogo, remetendo a falta de graça para uma coisa muito gentia. Apesar de não parecerem meras invenções irónicas, muito hipoteticamente eu poderia admitir que se tratavam de meros gracejos que não justificam a existência real de escritores de monólogo. De qualquer forma não vinha aí a contradição. Num artigo de jornal no (menos conceituado mas também sem motivos para ser pouco credível) “The Daily Yale S’news” leio o seguinte:
Late-night television host Jay Leno agreed : “People don’t need to know a thing about politics to understand a Strom joke,” he explained. “All they need to know is that he’s unbelievably old. I just mention his name, and bingo: the audience feels smart for getting a joke about the Senate, and my monologue writers get to go home early.”
Certamente é um texto onde o apresentador até prova que dispensa os escritores, mas para além da dose de ironia é praticamente inegável a existência de tais personagens invisíveis.
Finalmente fiz o óbvio que foi pesquisar o Internet Movie Database. Qualquer que seja a emissão a considerar do Tonight Show com Jay Leno, irão surgir variados nomes com a função de “Writers”, e mais uns tantos com o escarrapachado título de “Monologue Writers”.
Caro maradona, até se pesquisarmos “Sinhôzinho Malta” no IMDB obtemos resultados apurados. Onde é que alguma vez se viu no Finantial Times uma personagem do Roque Santeiro?

4 - Eu vejo uma diferença. E vejo-a abissal, porque um faz contra-reacção para atenuar os efeitos de uma piada destruída e o outro usa para amplificar a destruição. Ora eu que ando aqui a defender pouco mais do que as minhas preferências confesso-me apreciador do humor destrutivo no mais explosivo, caótico e literal sentido que lhe pudermos dar. Só para aproveitar a deixa que o maradona me dá ao referir o Herman José, dito o seguinte: eu cresci com o Herman José, porque tinha 3 anos quando rebentou o Tal Canal e porque lhe estou em dívida como referência e como catalizador de referências até ao fim da adolescência. Mesmo batendo continência ao Humor de Perdição ou ao Casino Royal, tenho a dizer – o motivo é de uma transcendência semi-religiosa – que o momento maior que recordo do Herman José é de certo dia em que de óculos escuros, casaco de cabedal e caçadeira em punho, destruiu o décor de um estúdio e vários electrodomésticos. É um marco pobre para uma carreira com momentos tão gloriosos - podem pensar e eu nem discordo em absoluto - mas para o entristecedor Herman José dos dias hoje, penso que só um momento catártico do género destrutivo poderá acender a velha chama e apagar o comodista loiro. Ele que pegue numa marreta e parta o cenário da SIC mais os dentes ao Monchique e as cópias em cd do “És tão boa”.
No meio da anterior divagação perdi a real discussão do ponto. Contra-reacção à má reacção da assistência. Leno que vem do stand-up (e que por lá continua), tem obrigação de aguentar um público, tarefa que supera sem dificuldades. A sua técnica depende muito do amortecimento. Conan quando dá tiros ao lado faz o público acreditar que afinal deu tiros no próprio pé. A técnica é a de gritar “fogo” em fuzilamento próprio. Já expliquei que gosto de tiros. E de Leno e de Conan. Como isto é menos uma argumentação do que um desfilar de declarações de preferência, neste capítulo sou outra vez favorável ao incandescentismo de O’Brien.

5 - Vejo o processo dos Monty Pyton, sobretudo neste regime de sketches do Flying Circus, de uma forma oposta. Primeiro o absurdo, antes até de qualquer formalização de uma ideia. O contexto é perfeitamente passível de ser metido a martelo. A ausência de contexto é perfeitamente passível de ser metida a martelo.
É sabido que ao “Papa do corpo” às vezes bastava-lhe entrar em cena para arrancar sinceras gargalhadas com a sua altura e magreza descomunais, por si só um nonsense visual. Eu que devo alguma coisa do meu desenvolvimento intelectual à precoce exposição ao Flying Circus, dou-me muitas vezes a contrariar uma tendência de intelectualizar em excesso os Monty Python. Tais como encontrar senso no não-senso. Tais como descodificar matematicamente (metafisicamente) uma punch-line brilhante nas situações mais deliciosamente desprovidas de código ou punch-line. Deixa de ser humor inteligente se se esquivar disso? Ou é assim tão inverosímil a invenção de uma situação a pretexto único de serem inseridas as pernas enormes de Cleese a dar passos estrambólicos?
Para terminar, já que falei em Monty Python, nonsense, Cleese, altura e magreza descomunais, absurdo ou passos estrambólicos, o mais acertado é
juntar Leno à receita?